sábado, maio 13, 2006




sobre levantar-se da poltrona e ir até a janela. chove e o carpete está limpo.

para Maria, voce tem olhos de estrela de cinema.


Urso polar dormindo confortavelmente sob o nome de poltrona sonha com um peixe no gelo, eriça-se com a anamorfose desse num objeto estranho, de mesmas proporções, mas com formas redondas e coloridas no lugar de escamas prateadas – objeto que ele nunca saberá que se esconde sob a graça de controle remoto. Assustado, mas dormindo, a percepção do objeto cinza claro percorre suas vértebras como mijar depois de ter bebido cinco litros de água e andado o dia todo de ônibus – as vértebras, que não dormem, se chacoalham levemente.

O leve chacoalhar das costas da poltrona é entendido pelo ocupante da mesma como uma prova irrefutável do seu livre-arbítrio, uma decisão incontrariável da sua própria participação no grande esquema das coisas – coisas essas alguns imaginam como formigas e que agora cedem ao impulso uma vez mais de ser um formigamento: três mil formigas atacando a batata da perna. Como o amigo do amigo numa mentira, o comichão peludo serve de descarga de privada e a poltrona se esvazia.

Antes descansando sobre o afofado nome de ocupante, aquilo ameaça cair estabanadamente no chão e sujar o carpete, mas maneja uma forma e agora se chama pessoa de pé. A pessoa restabelece e mapeia os limites, compreende a idéia do sapato e a idéia do pé, entende-os como seus, alegra-se com a possibilidade de movê-los e confunde a palavra possibilidade com a palavra escolha, aceitando isso sob o recorrente titulo de prova irrefutável de seu livre arbítrio – o que aceita, por sua vez, como o ato de relembrar e compreender um conceito.

Livre do abraço de urso, arrisca uns cinco passos em direção à frente, palavra misteriosa, que combina perfeitamente com janela, palavra transparente – isso é , que transporta o parentesco do externo para a tela difusa que mais parece um bloco de gelo derretendo, com toda essa chuva do lado de fora.

(Se esquimós vissem televisão, ninguém teria se mexido. Se pé se chamasse pés tudo teria ocorrido mais rápido. Se do ou tarde surge a proposta de parar (e a proposta carrega o mesmo pender pra frente, o enfadonho se segurar de pé, os mesmos sapatos e somente uma nova sensação de conforto, visto que é a pessoa que pararia( logo, a mesma pessoa.)))

Relevada a procedência do impulso e reconhecendo que da sala de cinema não dá pra abraçar as cabrochas na tela, a pessoa pára a uma distância razoável da janela, o suficiente para não sentir que está preso sob um lago congelado e que um urso polar faminto acaba de acordar.

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